Sutura Meniscal

​Os meniscos são estruturas fibrocartilaginosas presentes no interior do joelho e cujas funções mais importantes são: amortecimento, proteção da cartilagem e estabilização da articulação. Por isso, o objetivo principal do tratamento das lesões e rupturas do menisco cada vez mais tem sido a preservação meniscal por meio de técnicas de sutura ou reparo meniscal.

Neste sentido, sabe-se que a circulação sanguínea do menisco é importante para a cicatrização das lesões meniscais e pode ser dividida em 3 zonas ou regiões (da periferia para o centro do menisco): vermelha-vermelha, vermelha-branca e branca-branca. Portanto, quanto mais vascularizada a região do menisco afetada pela lesão, maior a chance de cicatrização após a sutura meniscal.

Além disso, o tempo entre a lesão do menisco e a cirurgia pode ser crucial para o sucesso da cicatrização. Sabe-se que as lesões agudas possuem qualidade tecidual com bom potencial para cicatrização, enquanto as lesões meniscais crônicas apresentam tecido comumente degenerado, dificultando o reparo meniscal.

Outros fatores que devem ser avaliados quando há indicação de sutura meniscalsão: idade, lesões ligamentares associadas (principalmente a do LCA), lesões da cartilagem, eixo do joelho, peso corporal, doenças sistêmicas (exemplo: a diabetes dificulta a cicatrização), compreensão do paciente sobre o período de reabilitação e as perspectivas esportivas, dentre os fatores mais relevantes.

TIPOS DE SUTURA MENISCAL:

​As técnicas de sutura ou reparo meniscal evoluíram muito nos últimos anos como resultado do melhor entendimento tanto da anatomia e da biomecânica articular quanto dos tipos de lesões meniscais, além do desenvolvimento de materiais e dispositivos cirúrgicos que propiciam a preservação do menisco.

​Basicamente, podemos dividir as técnicas de sutura meniscal em:

​- All-inside: técnica realizada totalmente pela artroscopia (“tudo por dentro”), ou seja, sem a necessidade de fazer outras incisões cirúrgicas além dos “furinhos” da artroscopia. Para a confecção da sutura meniscal, dispositivos previamente montados com fios e mini-implantes são inseridos através do menisco e o nó é realizado pela artroscopia.

​- Inside-out: técnica na qual a sutura meniscal é realizada com agulhas e fios específicos passados através do menisco de “dentro para fora” e na qual uma incisão auxiliar é necessária para a confecção dos nós.

​- Outside-in: técnica realizada de “fora para dentro” que também necessita de uma incisão auxiliar para a passagem de agulhas ou dispositivos e para a confecção dos nós da sutura meniscal.

​- Reinserção meniscal: técnica realizada em casos de lesão da raiz meniscal ou lesão radial e na qual são realizados pontos de ancoragem no menisco para tracioná-lo à sua posição anatômica.

​- Centralização meniscal: técnica indicada para casos de extrusão meniscalisolada ou associada à lesão da raiz meniscal e que tem o intuito de corrigir a extrusão meniscal, trazendo o menisco para a sua posição normal.

LESÃO MENISCAL VERTICAL:

​A lesão vertical geralmente acomete a região periférica do corno posterior do menisco em situações traumáticas como a entorse ou torção do joelho.

​Este tipo de lesão pode ocorrer de modo isolado, mas é muito frequentemente associado à ruptura do LCA e é considerada a indicação clássica para sutura meniscaldevido ao alto potencial de cicatrização proporcionada pela maior vascularização tecidual desta região meniscal.

​A técnica de sutura mais realizada atualmente para a lesão vertical instável no corno posterior do menisco é a all-inside devido à rapidez e à praticidade, mas a inside-out também pode ser indicada devido ao custo mais baixo.

A reabilitação pós-operatória normalmente segue o protocolo da cirurgia do LCA, porém, com uso de muletas por 45 dias e restringindo a flexão do joelho em 90º neste período.

LESÃO DA RAMPA MENISCAL: 

A lesão meniscal em rampa ocorre na região periférica posterior do menisco medial e geralmente está associada à ruptura do ligamento cruzado anterior (LCA). Estetipo específico de lesão meniscal ocorre como consequência de uma torção do joelho que simultaneamente rompe o LCA, acarretando instabilidade articular, falseio e dor no joelho.

O diagnóstico da lesão em rampa não é simples, pois na maioria das vezes o exame de ressonância magnética (RNM) não detecta a lesão. Alguns sinais sugestivosna RNM como o edema ósseo do platô posteromedial associado à lesão do LCA indicam a possibilidade desta lesão. Contudo, o diagnóstico desta lesão somente ocorredurante a cirurgia de artroscopia para o tratamento da lesão do LCA.

O tratamento da lesão em rampa pode ser conservador em algumas lesões estáveis, mas a maioria tem indicação de sutura meniscal realizada simultaneamente com a cirurgia para reconstrução do LCA. 

Dentre as diversas técnicas cirúrgicas descritas, a sutura meniscal realizada através do portal artroscópico posteromedial é a mais realizada. Por meio de instrumentos e pinças especiais, o cirurgião faz a sutura da lesão com dois ou três pontos. Outra opção técnica é a sutura meniscal all-inside, na qual dispositivos agulhados com fios e nós pré-tensionados são usados para o reparo da lesão em rampa.

A reabilitação pós-operatória normalmente segue o protocolo da cirurgia do LCA, porém, com uso de muletas por 45 dias e restringindo a flexão do joelho em 90º neste período.

LESÃO DA RAIZ MENISCAL:

As raízes meniscais são os pontos anatômicos de inserção óssea nas regiões posterior e anterior dos meniscos, sendo que as lesões acontecem mais comumente na raiz posterior.

Com a lesão da raiz meniscal, o menisco se desloca para fora da sua posição e acarreta extrusão meniscal, perdendo da sua função como amortecedor e estabilizador do joelho. Caso não tratada adequadamente, a lesão da raiz meniscal pode acarretar tanto em desgaste precoce da cartilagem do joelho (artrose) quanto em fraturas por insuficiência ou stress.

A ruptura da raiz posterior do menisco medial é uma frequente causa de dor no joelho em pessoas acima dos 50-60 anos e geralmente é relacionada com um stress lento e progressivo na região medial do joelho que culmina com a lesão da raiz meniscal. O diagnóstico é feito com auxílio do exame de ressonância magnética, mas, em muitos casos, pode estar associada ao joelho varo, sendo fundamental a análise do eixo do joelho por meio de radiografias panorâmicas.

Já a lesão da raiz posterior do menisco lateral ocorre comumente associada à lesão aguda do LCA e o médico ortopedista especialista em joelho deve suspeitar desta lesão em joelhos muito instáveis ao exame físico, pois o diagnóstico na ressonância magnética pode ser difícil.

O tratamento da lesão da raiz meniscal pode ser conservador em lesões parciais ou estáveis, mas a cirurgia está indicada na maioria dos casos.

A técnica cirúrgica é feita pela artroscopia do joelho e se baseia na confecção de 2 a 3 pontos de ancoragem na raiz com uso de pinças específicas e fios de alta resistência, que então são tracionados através de um túnel ósseo feito previamente no ponto de inserção anatômica na tíbia e fixados em um botão metálico.

A reabilitação pós-operatória é fundamental para o sucesso da cirurgia e o paciente deve usar muletas e ficar sem apoiar o membro operado durante 6 semanas e, somente após esse período, deve iniciar gradualmente a marcha com apoio.

Importante salientar que a cirurgia para a lesão da raiz meniscal está contra-indicada em pacientes com artrose avançada no joelho.

LESÃO MENISCAL EM ALÇA-DE-BALDE:

A lesão meniscal em alça-de-balde é semelhante à lesão vertical, mas que acomete praticamente todo o menisco desde o corno anterior até o corno posterior, e ocorre geralmente na zona de vascularização vermelha-branca ou vermelha-vermelha.

Este tipo de lesão está frequentemente associado à lesão do LCA, mas pode ocorrer isoladamente. Em muitos casos, o menisco lesionado se desloca dentro do joelho, ocasionado o chamado “bloqueio articular” ou travamento da articulação.

No passado (anos 70, 80 e até 90), o tratamento preconizado era a ressecção do menisco (meniscectomia). Contudo, com a perda de praticamente todo o menisco e de sua função amortecedora, este procedimento acarretava desgaste progressivo da cartilagem articular e consequente artrose no joelho.

Com o melhor conhecimento da anatomia e da biomecânica meniscal e à evolução de técnicas de sutura meniscal, a lesão em alça-de-balde passou a ser preservada na maioria dos casos, principalmente em pacientes jovens.

A técnica de sutura meniscal neste tipo de lesão é muito meticulosa e feita por vídeo (artroscopia), o que exige habilidade, treinamento e experiência do cirurgião. O cirurgião pode optar por técnica totalmente all-inside ou técnica híbrida, na qual confecciona os pontos por meio das suturas all-inside, inside-out e outside-in conforme a região do menisco.

A reabilitação pós-operatória normalmente segue o protocolo da cirurgia do LCA, porém, com uso de muletas por 45 dias e restringindo a flexão do joelho em 90º neste período.

LESÃO MENISCAL RADIAL:

A lesão radial do menisco ocorre no sentido transversal das fibras meniscais e pode ser classificada em parcial ou completa. Enquanto as lesões parciais podem ser tratadas de modo conservador ou por meio da meniscectomia parcial com mínima consequência na função amortecedora meniscal, as lesões completas devem primariamente ser suturadas para preservação meniscal devido à perda completa da função meniscal que acarreta instabilidade articular, lesões na cartilagem e artrose no joelho.

A sutura da lesão radial do menisco é um desafio ao cirurgião e pode ser feita de diferentes modos conforme a localização da lesão, a idade do paciente e as lesões associadas (exemplo: lesão do LCA). Há diversos tipos de pontos e métodos para o reparo deste tipo lesão. Dentre eles, os pontos em “X” e os paralelos horizontais são os mais realizados de modo all-inside ou outside-in, mas em alguns casos podem ser adicionados pontos por meio de túneis ósseos para melhor estabilidade da sutura meniscal, semelhante à técnica para a lesão da raiz meniscal.

A reabilitação pós-operatória é lenta e demorada, com utilização de muletas e sem apoio do membro operado por 45 dias. O retorno à prática de esportes pode levar mais de 6 meses conforme a recuperação de cada paciente.

LESÃO MENISCAL HORIZONTAL:

​As lesões horizontais são muito frequentes em pacientes acima dos 40 anos e geralmente tem origem por sobrecarga articular ou por início do processo degenerativo do joelho, sendo que o menisco medial é o mais acometido.

​O tratamento da lesão meniscal horizontal pode ser clínico (conservador) em muitos casos, principalmente quando o paciente é assintomático e sedentário. Nesta situação, recomenda-se perda de peso, condicionamento muscular e diminuição de atividades de impacto.

​Já em pacientes sintomáticos e que não melhoram com o tratamento conservador, a lesão horizontal tem indicação cirúrgica. Atualmente, a sutura menisca ltem sido indicada neste tipo de lesão com bons resultados. Porém, a meniscectomia pode ser realizada quando não for possível a sutura ou o paciente não puder seguir o protocolo de reabilitação.

​As opções de sutura mais comuns são a all-inside e a inside-out, ambas realizadas por meio da artroscopia. 

​Como a lesão horizontal acomete a zona avascular mais central do menisco, o cirurgião deve realizar algum tipo de “estímulo biológico” como auxílio da cicatrização, como por exemplo a perfuração óssea no intercôndilo ou a injeção de aspirado da medula óssea (geralmente retirado da crista ilíaca na bacia).

A reabilitação pós-operatória necessita uso de muletas por 45 dias e restrição da flexão do joelho em 90º neste período. 

EXTRUSÃO MENISCAL:

A extrusão meniscal pode ocorrer quando o menisco se “desloca para fora” da sua posição anatômica devido à ruptura da raiz posterior do menisco, à frouxidão crônica ou lesão aguda do ligamento meniscotibial, e também como consequência do desvio do eixo do joelho (geralmente no joelho varo). 

Os principais sintomas da extrusão meniscal são: dor no joelho, inchaço e dificuldade para agachar, dor para andar muito e praticar esportes. O diagnóstico é realizado em exames de ressonância magnética, ultrassom dinâmico (com e sem carga) e radiografias específicas. Como regra, considera-se extrusão meniscal quando há um deslocamento do menisco maior que 3 a 4 mm da margem medial ou lateral do platô tibial.

Muitos casos de artrose no joelho estão associados à extrusão meniscal, e este é um fator importante que deve ser levado em consideração na indicação do tratamento da extrusão, pois quando a artrose do joelho está em grau avançado, o foco do tratamento deve ser a artrose.

O tratamento da extrusão meniscal em casos leves e iniciais geralmente é clínico(conservador) por meio de fisioterapia, perda de peso, fortalecimento muscular e diminuição das atividades de impacto. Contudo, quando a lesão é mais extensa, pode ser indicada a cirurgia para o reposicionamento do menisco com técnicas de reinserção ou centralização meniscal, eventualmente associada à osteotomia para realinhamento do eixo do joelho.

LESÃO MENISCAL DEGENERATIVA: 

As lesões de menisco sempre foram consideradas como “lesões esportivas”, porém, inúmeros estudos recentes têm descrito diversos tipos de lesões meniscais que afetam pessoas de faixas etárias maiores e sedentárias.

Enquanto as lesões meniscais traumáticas são mais comuns em pacientes jovens e esportistas, as lesões degenerativas ocorrem com muita frequência em situações do cotidiano em pessoas acima dos 60 anos como consequência do envelhecimento natural da articulação e geralmente estão associadas à artrose ou osteoartrite do joelho. 

Nesta situação, o tratamento clínico (não cirúrgico) é o mais recomendado, pois a meniscectomia (ressecção do menisco) pode acelerar o desgaste da cartilagem e propiciar a progressão da artrose, enquanto a sutura meniscal tem pouco sucesso quando o tecido meniscal está degenerado ou envelhecido.

MENISCO DISCÓIDE:

O menisco discóide é uma alteração congênita na formação do menisco que setorna parecido com um “disco”, ao invés do tradicional formato anatômico meniscal em “C”. Essa disfunção ocorre comumente no menisco lateral e o diagnóstico é feito com maior frequência em crianças e adolescentes. Quando descoberto por acaso na vida adulta, pode ser tratado sem cirurgia.

Quando há ruptura do menisco discóide, o paciente pode sentir dor, inchaço e bloqueio articular. Geralmente a cirurgia é necessária para o recorte do excesso do menisco chamado de “saucerização” ou meniscoplastia. Atualmente, também estáindicada a sutura do menisco residual para preservação da sua função amortecedora.